(IN)DISPENSABILIDADE DA AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA E (IM)POSSIBILIDADE DE CONVERTER, DE OFÍCIO, PRISÃO FLAGRANCIAL EM PREVENTIVA SEM MANIFESTAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. (PARECER DO MPF).
Brevíssima Explanação dos Acontecimentos
O Juiz de
Direito da 1ª Vara de Alfenas (MG) dispensou a audiência de
custódia e converteu a prisão flagrancial em prisão preventiva, de ofício.
Adiante o
TJ-MG se manifestou em sentido favorável a decisão do juízo a quo, ou seja, pela possibilidade de
“conversão da custódia flagrancial em preventiva pelo magistrado sem prévia manifestação do Ministério
Público ou requerimento da Autoridade Policial”, acórdão este que ensejou a
impetração de HC para apreciação da temática no Superior Tribunal de Justiça.
Do Parecer do MPF
Antecipadamente,
vale lembrar que este parecer é o entendimento da Subprocuradora-geral da
República Raquel Dodge e não vincula os demais membros do MP, pois a
independência funcional é um princípio institucional garantido na Lei Orgânica do MP (Lei nº 8.625/93, art. 1, parágrafo único) e na Constituição da República
Federativa do Brasil (art. 127, §1°).
Feita as
explanações iniciais, podemos adentrar na temática central desse parecer. No HC
temos em debate duas questões jurídicas da maior importância constitucional, a
qual seja: (1) indisponibilidade da audiência de custódia de pessoa presa em
flagrante; e (2) a (im)possibilidade de conversão de prisão em flagrante em
preventiva de ofício pelo juiz, sem requerimento do MP.
A
Subprocuradora-geral da República mencionou decisões dos Ministros Celso de
Mello e Gilmar Mendes, os quais são categóricos em afirmar que “a audiência de
custódia é garantia fundamental do cidadão e não pode ser dispensada pelo juiz;
e a prisão preventiva deve ser requerida ao juiz pelo MP e não pode ser
convertida de ofício a partir da prisão em flagrante”.
A audiência
de custódia é um importante mecanismo previsto no art. 310 do Código de
Processo Penal, e fala em prazo máximo de 24 horas para sua realização. Dessa
forma, trata-se de uma obrigatoriedade a realização desta apresentação do
custodiando perante uma autoridade judicial, seu advogado/defensor e MP. Não
cabe mitigação deste direito público subjetivo de caráter fundamental.
Dispensada
as discussões doutrinárias sobre o tema, vivemos sob um sistema acusatório (art.
3°-A do CPP) que busca limitar a atuação de ofício de um juiz “faz tudo”
(explicação pífia, mas suficiente para compreensão dos neófitos). A CRFB/88
determinou como função institucional do MP “promover, privativamente a ação
penal pública”, ou seja, o Parquet é o “senhor” da ação penal, portanto, se o
MP não se manifestou por uma prisão não caberia ao um juiz, aos remontes do
sistema inquisitivo, determinar de ofício a conversão de flagrante em
preventiva.
Ademais, “a
expressão ‘de ofício’ que constava do art. 282, §2°, e do art. 311, ambos do
CPP, vedou, de forma absoluta, a decretação da preventiva sem o prévio ‘requerimento
das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da
autoridade policial mediante requerimento do MP”, de tal modo, não havendo
justificativa legal para uma atuação um tanto quanto inquisitório por parte do
juízo.
Fazendo menção
a obra do doutrinador Alexandre Rosa (Guia do Processo Penal, conforme a Teoria
dos Jogos), expressa que não se invoca o poder geral de cautela para justificar
tal prisão. Rodrigo Capez, em publicação no CONJUR (link nas referências),
afirma que o poder geral de cautela permite que no processo civil o juiz conceda
tutela de urgência de acordo com determinado caso concreto ainda que não
prevista em lei. Contudo, quando falamos de processo penal que é um limitador
do poder punitivo estatal, torna-se inviável sua aplicação pelo “princípio da
legalidade da repressão”, exigindo “observância da legalidade estrita e da tipicidade
processual para qualquer restrição ao direito de liberdade”, ou seja, não está lei, portanto, juiz não faz.
Por fim,
não sendo realizada a audiência de custódia em 24 horas, conforme previsão legal e
ainda ter uma prisão em flagrante convertida em preventiva sem prévio
requerimento do MP, é se deparar com uma aberração tamanha aos preceitos
internacionais, constitucionais da garantia do devido processo legal e da paridade de armas, tratando-se de um verdadeiro retrocesso um tanto quanto
inquisitivo ao Processo Penal. De tal modo, cabe enaltecer o Ministério Público que cumpriu, mais
uma vez, sua missão de custos legis e
garantidor da ordem jurídica, pois por meio do parecer irretocável da
Subprocuradora-geral exprimiu o mais lídimo espírito da Justiça no que diz
respeito as garantias fundamentais previstas em nossa Constituição.
Referências
1.https://www.conjur.com.br/2020-ago-04/prisao-flagrante-nao-convertida-oficio-preventiva
2.https://www.conjur.com.br/2017-mar-06/rodrigo-capez-processo-penal-nao-existe-poder-geral-cautela
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